Jorge Terra

17 de abril de 2024

A CONSTITUIÇÃO DE UM PLANO DE ENFRENTAMENTO DAS ALTAS TAXAS DE MORTALIDADE DE JOVENS NEGROS E POBRES

A CONSTITUIÇÃO DE UM PLANO DE ENFRENTAMENTO DAS ALTAS TAXAS DE MORTALIDADE DE JOVENS NEGROS E POBRES.

 

Resumo: As taxas de mortalidade de negros e pobres no Brasil são muito altas. Essas taxas são mais elevadas quando considerada a parte mais jovem da população. Instituindo uma Comissão, o Parlamento realizou investigação sobre as causas possíveis de um número elevado de negros e pobres serem vítimas de homicídio. Concluídos os trabalhos, com o fim de alterar essa situação, objetiva-se a aprovação de emenda constitucional e de projeto de lei para que haja um plano que gere mudança significativa do atual quadro. Evidente é a valorização que a Comissão confere à lei, tendo-a como instrumento capaz de realizar mudanças. Todavia, sem desmerecer esse ponto de vista, é importante que o plano esteja conectado com outras questões e não apenas com a segurança, havendo preocupação sistemática e abrangente. A lei isoladamente pouco mudará o quadro vivenciado. Ela é um meio que deve estar de acordo com outros para que os resultados sejam transformadores. Sem se alterar a educação, o mercado de trabalho e outros espaços importantes, não serão atingidos resultados significativos. Deve haver preocupação com a eficiência e com a eficácia das políticas públicas, bem como com a influência de stakeholders. Além disso, é de se promover mais audiências para reunir mais conhecimentos, criar parcerias e identificar possíveis adversários, identificando que contribuição o Direito pode oferecer na solução desse problema.

Palavras-chave: mortalidade, jovens negros, planejamento.

  1. Introdução

A Proposta de Emenda Constitucional tombada sob o número 129/2015 versa sobre a inclusão dos incisos III e IV no parágrafo 8º do artigo 227 da Constituição Federal.

Por meio de uma construção legislativa, objetiva-se a solução de tormentosa questão, uma vez que há constatação da perda de numeroso contingente de pessoas em decorrência da violência amplamente disseminada em solo pátrio.

Imprescindível analisar se a escolha levada a cabo é adequada e suficiente, se o problema visado merece a atenção que se pretende empregar e se há caminho estrategico a ser criado e sedimentado.

Nesse sentido, não se pode descurar de iniciativas aduzidas com o fim audacioso de se extinguir ou de se minimizar os efeitos das desigualdades vivenciadas no Brasil.  Tampouco pode haver a omissão de algum dos atores, devendo todos ofertar  o melhor de seus esforços para o atingimento de objetivos nobres e viáveis.

  1. O quadro vivenciado: alta mortalidade de negros no Brasil

Temas como igualdade racial, saúde da população negra, crimes raciais, interferência da raça ou da cor para obtenção ou manutenção de emprego, inserção da história e da cultura negra nos currículos escolares são relegados a planos que os aproximam da “invisibilidade” e os tornam como interessantes e necessários somente para uma parcela da população brasileira.

A verdade é que essas temáticas deveriam ser relevantes para todo o corpo social. Em não sendo, seriam, pelo menos, para a comunidade negra que, sabidamente, ultrapassa a metade da população brasileira.

No supracitado cenário, não surpreende a pouca ou nenhuma atenção com a mortalidade de jovens negros demonstrada nos ambientes acadêmicos e políticos apesar de os dados serem há muito alarmantes. Cumpre aqui, ao reproduzir parte das conclusões de pesquisa levada a efeito no ano de 1.998, sublinhar que à época, não se apresentou recorte racial nas análises. Todavia, empiricamente e pelos dados geográficos e culturais mencionados, ficava evidenciada a possibilidade de que muitos dos casos podiam ser de jovens negros[1].

Nossas taxas referentes a homicídios e outras violências, semelhantes às dos EUA, são 20 vezes superiores às taxas da Itália ou do Canadá; quase 50 vezes superiores às da Irlanda ou da Espanha, entre muitos outros países. E, neste campo ainda, algumas das informações derivadas do Sistema de Informações sobre a Mortalidade são realmente estarrecedoras: no plano nacional, 35,1% das mortes de jovens devem-se a homicídios e a outras violências. Nas capitais do país, essa proporção se eleva para 41,8% e, nas regiões metropolitanas, para 47.7%. Praticamente, uma em cada duas mortes de jovens nas regiões metropolitanas têm sua origem nesta causa.

Em se cuidando do direito fundamental à vida, o que restava e resta violado ou, no mínimo comprometido, faz com que o Direito esteja obrigado a buscar alternativas tendentes a, ao menos, minimizar a situação vivenciada. Não se pode desconsiderar que o decorrer do tempo sem a tomada de decisões públicas e privadas qualificadas  gerou repercussões diretas e indiretas nos campos vinculados ao direito fundamental ao desenvolvimento e a outros de igual relevo. Assim sendo, é inegável que é indispensável uma articulação acelerada, pois os dados conhecidos não permitem mais adiamentos e inércias.

Nessa linha, é importante perceber a sofisticação atingida pelo estudo denominado de Mapa da Violência. Já no pertinente ao ano de 2.016, ele demonstra a evolução dos homicídios por armas de fogo no Brasil dentro no período de 1980 a 2014. Além disso, escancara-se a incidência de fatores como o sexo, a raça/cor e as idades das vítimas dessa mortalidade, apontando-se as características da evolução dos homicídios com a utilização de armas de fogo nas unidades da federação, nas Capitais e nos Municípios com elevados níveis de mortalidade [2].

São magnitudes tão absurdas e surreais que torna-se difícil dimensionar seu significado, foge a nosso entendimento e experiência. Temos, para dar um exemplo, que a AIDS, causada  pelo  malfadado  vírus  da  imunodeficiência  humana  (HIV),  matou  12.534 pessoas no ano de 2014. É um número que revela uma situação preocupante, dando origem,   justificadamente,   a   numerosos   campanhas,   programas,   mecanismos   de prevenção, proteção e/ou tratamento. Mas este outro flagelo, o das armas de fogo, que nesse mesmo ano matou um total de 44.861 pessoas — quase quatro vezes mais que a  AIDS — pouca  ou  nenhuma  atenção  parece  merecer.  No  máximo,  discursos preocupados  e/ou  políticas  pontuais,  contingenciadas  tanto  na sua  cobertura  e incidência, quanto no seu financiamento, continuidade e centralidade.
Mais adiante, frisa-se que a questão racial é crucial para se bem compreender a segurança no Brasil[3]:

Ainda mais perversa e preocupante é a seletividade racial dos HAF, além de sua tendência crescente. Entre 2003 e 2014, as taxas de HAF de brancos caem 27,1%, de 14,5, em 2003, para 10,6, em 2014; enquanto a taxa de homicídios de negros aumenta 9,9%: de 24,9 para 27,4. Com esse diferencial, a vitimização negra do país, que em 2003 era de 71,7%, em poucos anos mais que duplica: em 2014, já é de 158,9%, ou seja, morrem 2,6 vezes mais negros que brancos vitimados por arma de fogo.

No já assazmente referido estudo, elenca-se como causa da inegável desigualdade de tratamento entre brancos e negros na atualidade a longa escravização no Brasil.

Outra causa seria a crescente privatização do aparelho de segurança, ou seja, a ofertada para os que podem ou não pagar conduz a um quadro de desigualdade e de injustiça. Enquanto os brancos disporiam de uma segurança privada somada à uma precária segurança pública, os negros disporiam, em regra, apenas da pública por terem menor remuneração e maior taxa de desemprego. Ademais, inserta dentre os temas de interesse político-eleitoral, a segurança vê seus gestores tendo como critério de distribuição de efetivos e de recursos, bem como de necessidade de realizar investigação e de elucidar casos, a posição socioeconômica e a localização geográfica das pessoas, privilegiando os bairros mais abastados.  Esse quadro, sem sombra de dúvidas, criou maiores dificuldades para os negros. Isso sem se olvidar de que a letalidade e seletividade policial também tem conduzido a uma maior vitimização negra.

Os mencionados trabalhos estão acompanhados de outros de iguais níveis de qualidade e de credibilidade. Dentre eles, traz-se aqui o Atlas da Violência 2.017 produzido pelo Instituto de Pesquisa Aplicada (IPEA) e pelo Forum de Segurança Pública em parceria.

Colhe-se do primeiro o ensinamento sobre a imprescindibilidade de o Brasil alterar sua forma de registro com o fito de diminuir seus índices de subnotificação, bem como de alterar seus procedimentos com o fim de diminuir a letalidade e a violência policial.

Assim está consignado no Atlas supradito:

A categoria “intervenções legais e operações de guerra”, registro Y35-Y36 do SIM, continua apresentando um alto grau de subnotificação, como confirmam os números da segurança pública. Em 2015, o SIM registrou apenas 942 casos de intervenções legais(Tabela 3.1), enquanto a segurança pública registrou 3.320 mortes decorrentes de intervenções policiais (Tabela 3.2), ou seja, 3,5 vezes o número de registros da saúde.

Para além da necessidade de rever os protocolos de registro para esses casos pela área da saúde, devemos insistir na mudança de um modelo de segurança pública que, se não promove, é conivente com o uso abusivo da força letal e execuções sumárias, ao mesmo tempo que expõe e vitimiza cada vez mais os seus agentes.

Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública indicam que, em 2015, ao menos 358 policiais civis e militares constam das estatísticas de homicídio do país.

Nos últimos anos, assistimos a um realinhamento a favor desse modelo de atuação policial que permanece com o um dos maiores desafios de nosso processo de consolidação democrática e de um efetivo Estado de Direito.

Estar-se-ia privilegiando um atuar belicista e não dialogal, ampliando-se o número de vítimas inclusive de policiais. Aliás, sobre as vítimas policiais, importante consignar o seguinte trecho do mencionado Atlas da Violência:

De cada 100 pessoas que sofrem homicídio no Brasil, 71 são negras. Jovens e negros do sexo masculino continuam sendo assassinados todos os anos como se vivessem em situação de guerra. Cerqueira e Coelho (2017), a partir de análises econométricas com base nos microdados do Censo Demográfico do IBGE e do SIM/MS, mostraram que a tragédia que aflige a população negra não se restringe às causas socioeconômicas. Estes autores estimaram que o cidadão negro possui chances 23,5% maiores de sofrer assassinato em relação a cidadãos de outras raças/cores, já descontado o efeito da idade, sexo, escolaridade, estado civil e bairro de residência. Cerqueira e Coelho mostraram que, do ponto de vista de quem sofre a violência letal, a cidade do Rio de Janeiro é partida não apenas na dimensão econômica entre pobres e ricos, ou na dimensão geográfica, mas também pela cor da pele. Ao calcular a probabilidade de cada cidadão sofrer homicídio, os autores concluíram que os negros respondem por 78,9% dos indivíduos pertencentes ao grupo dos 10% com mais chances de serem vítimas fatais, conforme o Gráfico 5.1 deixa assinalado.

Esse caráter discriminatório que vitima proporcionalmente mais a

juventude negra também foi documentado no estudo “Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência e Desigualdade”. Neste trabalho, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública incorporou um indicador de desigualdade racial ao indicador sintético de vulnerabilidade à violência dos jovens (mortalidade por homicídios, por acidente de trânsito, frequência à escola e situação de emprego, pobreza e desigualdade).

III. A construção legislativa de solução

Após a conclusão dos trabalhos pertinentes à Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a apurar as causas, consequências e custos sociais e econômicos da violência, das mortes e dos desaparecimentos de jovens negros e pobres, denominada de CPIJOVEM, foi apresentada, em 09/09/2015, a proposta de emenda à constituição número 129/2015.

Essa proposta contou com as assinaturas de 178 Deputados Federais, exigência do inciso I do artigo 60 da Constituição Federal, o que permitiu sua distribuição à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, onde foi apresentado e aprovado parecer favorável à sua tramitação, em 25/10/2016 e em 21/11/2017 respectivamente, por se reconhecer sua constitucionalidade e sua juridicidade.

Publicado o parecer supracitado e mediante requerimento do Deputado proponente, foi instituída, em 30/11/2017, comissão especial, a ser composta por trinta e quatro titulares e pelo mesmo número de suplentes, para que seja proferido parecer à PEC 129-A nos termos do regimento interno da Câmara dos Deputados.

A proposta tem por fulcro a inserção dos incisos III e IV no parágrafo 8º do artigo 227 da Lei Maior com o fito de que os entes da federação instituam planos de enfrentamento aos homicídios de jovens e de que seja criada lei que preveja que os planos sejam decenais e de que haja articulação entre as esferas de poder, entre si, e com a sociedade civil para a execução de políticas públicas que conduzam à redução do número de homicídios de jovens no Brasil.

A redação atual do artigo a ser alterado é a seguinte:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)

(…)

  • 8º A lei estabelecerá: (Incluído Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)

I – o estatuto da juventude, destinado a regular os direitos dos jovens; (Incluído Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)

II – o plano nacional de juventude, de duração decenal, visando à articulação das várias esferas do poder público para a execução de políticas públicas. (Incluído Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)

Já a proposta de emenda à constituição tem o seguinte teor:

Art. 227. (…)

(…)

  • 8º (…)

III – os plano nacional, estadual, distrital e municipais do enfrentamento do (sic) homicídios de jovens;

IV – a lei disporá sobre os planos de enfrentamento de homicídios de jovens, de duração decenal, visando à articulação das várias esferas de poder e sociedade civil para a execução de políticas públicas para a redução de homicídios de jovens.

Importa consignar que a lei prevista no proposto inciso IV, por meio do projeto de lei número 2.438/2.015, também em decorrência do trabalho desenvolvido pela já mencionada comissão parlamentar de inquérito, teve seu texto apresentado para apreciação da casa legislativa mencionada.

No que concerne à PEC, cumpre dizer que sua tramitação e as discussões e ações que ensejará já configuram certo avanço, pois se efetivamente cumpridas as atuais disposições do artigo 227 da Lei Maior, sobretudo porque ele determina prioridade absoluta para o atendimento de questões relevantíssimas que envolvem as crianças, os adolescentes e os jovens, a situação restará bem superior à atual. Sublinhe-se que o caput do artigo 227 torna obrigados a família, a sociedade e o poder público.

A verdade é que há a necessidade política de se reforçar as disposições já existentes e de articular ações concretas voltadas ao alcance de resultados positivos.

Normalmente, os planos são aduzidos pelo Poder Executivo, pois implicam a assunção de compromissos, inclusive orçamentários relacionados à criação de estruturas e de cargos, que tornam o chefe daquele poder o legitimado para trazer às luzes legislação que formaliza acordos e articulações entre as esferas de poder e a sociedade civil.

O quadro atual, que é objeto de críticas no âmbito internacional, no entanto, impõe que parlamentares tomem iniciativas que induzam os agires dos Poderes Executivos e das entidades privadas, incluindo na agenda nacional o tema em comento. Isso porque sabedores que o Brasil, conforme estudo publicado no mês de novembro de 2017 pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância(UNICEF)[4], está no sétimo lugar no ranking de países onde morrem mais crianças e adolescentes em decorrência de homicídios. Dessa arte, refugindo de debates sobre eventual vício de origem, não é vedado que parlamentares ou o parlamento ofereçam, após articulações com a sociedade civil e com os Poderes Executivos, sugestão de texto legal diretamente ao Poder Executivo.

Sublinhe-se que, na justificativa relativa ao projeto de lei número 2.438/2.015, parcialmente reproduzida abaixo, o proponente aponta que os Executivos tem melhores condições de instituir os planos de enfrentamento que compreende ser indispensáveis.

Além disso, vislumbramos que o Poder Executivo é o único detentor das condições para definir objetivos, metas globais e setoriais, os programas e recursos necessários, que são elementos que, de fato, caracterizam um plano.

Partimos, portanto, do pressuposto que um documento denominado Plano Nacional de Enfrentamento ao Homicídio de Jovens é uma peça a ser elaborada pelo Poder Executivo, em estreita colaboração com a sociedade e os demais Poderes. Nesse sentido, a principal contribuição do Poder Legislativo reside em apresentar um documento de diretrizes, estas construídas a partir da ausculta dos jovens e a todos os interessados, processo que ocorreu de forma intensa durante os trabalhos da CPI.

No projeto de lei sub examine, preveem-se competências para a União, para os Estados, para o Distrito Federal e para os Municípios e não, por exemplo, para as Casas Legislativas, incluindo Tribunais de Contas e para o Poder Judiciário.

Destaque-se que há artigo no qual se institui o plano (artigo 1º); há artigos nos quais se estabelecem as competências para instituir os planos nacional e regionais (artigos 4º, I, 5º, I, 6º, I e 7º); há a promessa de se limitar a trazer à tona diretrizes por se compreender os Poderes Executivos como os capazes de instituir os planos nacional e regionais (justificativa). Evidencia-se, no texto, existência de contradição a ser corrigida portanto.

Há artigo que prevê as diretrizes dos planos (art. 3º). Se por um lado há o elogiável estabelecimento de uma meta, o que permite que sejam criados indicadores para se examinar os resultados e impactos dos planos, percebe-se, por outro, que o maior detalhamento das diretrizes permitiria um maior controle a posteriori, bem como um maior controle dos parlamentos sobre o instrumento a ser criado pelos Poderes Executivos.

Outrossim, não se constata a criação de relação com outras iniciativas existentes ou pendentes de efetivação, o que impede real ataque ao racismo institucional. E mais, não se entabula hipótese na qual se perceba o negro como sujeito das transformações que precisam ser levadas adiante.

Em outros termos, a diversidade no seio das instituições integrantes do sistema de justiça e de segurança é meio capaz de mudar os valores institucionais e a mera adoção do sistema de cotas raciais nos processos seletivos revela-se insuficiente para tal empreitada. A insuficiência reside tanto no número pequeno de cotistas que logram êxito nos certames para provimento de cargos vinculados à atividade-fim dessas instituições, quanto na falta de estrutura institucional que acompanhe o servidor durante um determinado período de sua vida funcional e não apenas o selecione.

É, com efeito, preciso pensar-se no sistema de cotas menos como forma de acesso diferenciado ao cargo público e mais como forma de contribuição do servidor que teve vivência diferenciada para a constituição de uma instituição mais democrática, transformadora, competitiva e apta a construir soluções para os problemas da sociedade, dentre eles a morte de jovens pobres e negros.

Frisa-se que, em 1º/11/2017, foi aprovada a audiência pública realizada em 7/11/2017, para a oitiva de dois integrantes do sistema de justiça, um do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e outro da Procuradoria-Geral do Estado do Rio Grande do Sul, convidados por suas trajetórias pessoais e não como representantes institucionais, e de dois representantes de instituições ligadas ao movimento social, ambas do Rio de Janeiro. A elogiável iniciativa de ouvir pessoas precisa ser reprisada em outros locais do país, permitindo-se a apreensão das diferentes realidades e a entrega de sugestões qualificadoras do trabalho a ser realizado. Obviamente, o trabalho de itinerância e de verdadeira e rica troca com a sociedade deve ser realizado dentro de período determinado e com o firme propósito de ouvir aqueles que são favoráveis e os que são desfavoráveis à concretização das medidas que se vislumbram inafastáveis.

Essa oitiva ampliada, chamemo-na assim, permitirá a constituição de um parecer referente ao projeto de lei, foco da audiência pública mencionada acima, no qual sejam evidenciados os conhecimentos, as iniciativas, as políticas públicas a serem constituídas ou efetivadas, as pessoas e as instituições privadas e públicas indispensáveis para que o trabalho seja altamente qualificado; permitirá também a identificação de possíveis parceiros nas caminhadas nos seios do Legislativo, do Executivo e Judiciário, bem como de possíveis adversários, seus argumentos, suas fragilidades e seus interesses em negociar.

É possível já depreender que a mobilização que se faz urgente ganhará mais intensidade e profundidade se os seus limites não forem os estreitos da segurança, mas se a ela forem incorporados o que pertine ao desenvolvimento, à eficiência e à eficácia das políticas públicas, à imprescindibilidade do planejamento e à sustentabilidade dos investimentos sociais e econômicos, bem como a preocupação com infraestruturas físicas e sociais.

  1. Um caminho para a construção de soluções

Oportuno consignar que a lei é um instrumento para a construção de solução, mas não é o único, tampouco a garantia de que haverá modificações concretas positivas. Ressalte-se que a lei não é o ponto final de uma caminhada que depende de mudança comportamental significativa.

Nesse teatro, não se vislumbra solução se as questões até o momento abordadas o forem de forma isolada e limitada. Se a força motriz dos problemas está no racismo e se esse é estruturado, somente uma ação sistêmica pode impactar positivamente o teatro já descrito.

A enorme mortalidade de jovens brasileiros, em especial de negros e de pobres, integra um conjunto de questões relevantes que são tidas como de somenos importância ou valia. Não se há de desconsiderar que, há muito, sem a força capaz de ensejar transformação, gritam segmentos numericamente importantes da sociedade por um melhor trato da igualdade racial na educação, na saúde, no mercado de trabalho, na segurança e nos espaços de poder.

Esse desconsiderar é que forma os nocivos quadros dos racismos estrutural e institucional, que se apresentam de diferentes formas, em diferentes momentos e intensidades. Por via de consequência, entende-se que a atuação deve ser sistematizada e deve ter por norte o campo do desenvolvimento do país e da comunidade negra em especial, permitindo-se a busca de novos atores, de diferentes soluções e de novos e maiores recursos humanos e financeiros.

O movimento social, especialmente o movimento negro, tem sido atingido pela tomada ou pela não tomada de decisões transformadoras. Todavia, em não raras vezes, não consegue influenciar significamente nas tomadas de decisão, sendo um stakeholder com extremo interesse, mas pouco ou nenhum poder ou influência.

Inafastável verdade é que o Brasil assumiu compromissos graves de naturezas diversas. As assunções supraditas estão no texto da Carta Magna, em atos internacionais e em leis de abrangência interna.

No que concerne ao desenvolvimento, o proceder brasileiro não é diferente, estando estampado na constituição pátria como um objetivo republicano, bem como em atos internacionais bi ou multilaterais e em leis nacionais.

Relevante é definir que abordagem se dá ao desenvolvimento, não o tendo como sinônimo de crescimento econômico, mas o concebendo como mais amplo. Assina-se que o crescimento econômico acelerado seria uma condição indispensável, mas não suficiente para se reduzir a pobreza e a desigualdade social, já que aquele pode se dar com desemprego, exclusão, sem participação, com destruição de culturas nacionais e com deterioração do meio ambiente.

Não se pode tirar de visada que o desenvolvimento nacional deve ser sustentável, ocorrendo em uma sociedade justa, livre e solidária, com foco na promoção do bem de todos, erradicando a pobreza e a marginalização, bem como reduzindo as desigualdades. De outro modo, a pretexto de cumprir norma extraível do texto constitucional, estaríamos a descumprir outras de mesma origem e grau hierárquico. Não se há de recair no equivocado entendimento de que o crescimento econômico naturalmente será “derramado” sobre os cidadãos mais pobres. Mister que haja a superação do modelo do derrame, percebendo-se que o desenvolvimento social é vital para o desenvolvimento econômico sustentado, porque os investimentos em capital humano e capital social e a melhoria da equidade são necessários para o crescimento econômico ser sólido[5].

O desenvolvimento é resultado de ações articuladas e continuadas, tornando-se um desafio para as sociedades. Ele exige convicção e força na busca do equilíbrio entre seus custos e suas vantagens, tanto no plano regional quanto no global, impondo discussão sobre campos e formas de atuação estatal, bem como sobre regras de regulamentação.

O desenvolvimento está imbricado com a eficiência. Por conseguinte, é indispensável sobre ela também tratar.

A eficiência deve ser perseguida na gestão brasileira, independentemente de posicionamento ideológico, sobretudo após o advento da Emenda Constitucional número 19/98 que, mais do que acrescer o princípio correspondente na cabeça do artigo 37 da Constituição Federal, estatuiu um sistema voltado à transição de uma administração pública patrimonialista para uma administração pública gerencial, ou seja, voltada para o alcance de resultados concretos positivos.

A eficiência, seja como princípio, seja como postulado, é um critério de atuação administrativa concernente à utilização adequada dos meios disponíveis para se atingir os fins de interesse público, sejam eles primários ou secundários, da maneira mais abrangente e profunda possível diante das peculiaridades do caso concreto. Essas peculiaridades são o nível de informação que pode ser obtida pelo agente, o tempo disponível para o enfrentamento do problema, a quantidade de recursos disponibilizados e a necessidade de se satisfazer mais de um fim com o mesmo meio.

A eficiência, na medida em que é critério normativo da atuação administrativa, deve estar inserida no encaminhamento das soluções de problemas de diversas ordens em cotejo com os outros princípios encartados no caput do artigo 37 da Carta Magna. Ela, assim, atrelada aos seus fundamentos e aos aspectos atinentes à sua operacionalidade, poderá ser fator de transformação cultural, institucional, econômica e social, proporcionando a consecução dos Objetivos entabulados no artigo 3º da nossa Lei Maior, dentre eles o do desenvolvimento nacional.

É fundamental, dessarte, que haja um manejo das externalidades capazes de gerar afastamento ou retardo do atingimento dos resultados positivos tão necessários para a consecução do desenvolvimento. As externalidades mencionadas acabam conformando o ambiente vivenciado, bem como influenciando a performance das instituições públicas e privadas que objetivam alcançar eficientemente o fim anteriormente apontado.

Anote-se que compromisso institucional da dimensão que tem o desenvolvimento não é atingido sem atenção à infraestrutura. Nesse sentido, é forçoso tratar de infraestrutura, compreendendo-se o Direito como um de seus elementos estruturantes e definindo esse último como o somatório do arcabouço jurídico com seus processos legislativos, das estruturas administrativas, das atividades administrativas, das procedimentalizações, das decisões proferidas nos âmbitos administrativo e judicial com seus respectivos critérios e métodos, bem como dos níveis de eficiência, de eficácia e de celeridade atingidas. Aliás, o Direito administrativo, nas fases que vivenciamos e na que precisamos ainda vivenciar, configura-se em ramo que rege as atividades jurídicas do Estado que deve atender os interesses públicos tendo por norte a segurança e o benefício dos administrados.

A infraestrutura pode ser física como o são a malha rodoviária, as redes de comunicação, o sistema energético, bem como social, como a educação, a saúde, o sistema jurídico.

A infraestrutura deve ser aquela que, no mínimo, tenha o nível suficiente para que haja o desenvolvimento de forma sustentável. É evidente que os riscos são inerentes à atividade administrativa e à vida negocial. Entretanto, a administração perseguidora de resultados sociais, ambientais e econômicos tendentes ao cumprimento dos objetivos republicanos está forçada a, de forma planejada e sistêmica, minimizar ou evitar os seus efeitos.

O ponto é que, apesar do contido no artigo 174 da Constituição Federal, não desenvolvemos a cultura do planejamento no campo prático, sobretudo quando é indispensável pensar a longo prazo.

A complexidade das administrações públicas e a das crescentes demandas a elas apresentadas em um quadro de recursos limitados, de exiguidade de tempo e de necessidade de atingimento de fins exigem o emprego de planejamento.

De início, já se sublinha que planejar, sinteticamente, é definir fins satisfatórios ou ótimos dependendo das situações vivenciadas e dos recursos disponíveis, bem como dos meios adequados ao atingimento dos primeiros.

O planejamento ou a condução de um planejamento, em numerosas ocasiões, exige o conhecimento aprofundado dos processos, dos produtos ou dos serviços pertinentes, bem como dos insumos envolvidos e da cadeia indispensável para os obter. Além disso, exige também a capacidade de obter, de classificar e de utilizar informes e informações, bem como, tendo uma boa noção dos comportamentos cooperativos ou não das pessoas envolvidas em alguma parte do processo, de realizar prognoses.

O planejamento é uma atividade racional, mas que, em algumas hipóteses, pode não desprezar a intuição, sendo importante conhecer ou buscar conhecer questões comportamentais do público-alvo ou dos componentes do grupo de trabalho. Não se pode olvidar, contudo, de que o agente terá uma racionalidade limitada, ou seja, uma deficiência de informação ou de como computar os dados ou as informações de que necessita[6].

Poderá a limitação estar vinculada aos meios, como a insuficiência de recursos humanos ou financeiros para buscar ou para manipular dados. Sim, não se pode descurar dos custos administrativos tal como do tempo para se obter informações, podendo a análise custo-benefício ser ou não suficiente para se atingir uma conclusão. Aliás, guardando-se atenção à sustentabilidade, não serão raras as vezes que a análise mencionada não será bastante.

Haverá ocasião na qual a limitação estará vinculada ao fim, exigindo que previamente o agente decida se perseguirá uma decisão ótima ou uma decisão satisfatória. Isso se dará quando o caminho eleito gerar gritante diferença de tempo, de custo ou de outra natureza. Obviamente, essas questões devem ser cotejadas com o retorno a atingir e esse poderá ou não ter expressão financeira.

Não se há de esquecer que intercorrências podem evidentemente exsurgir, sobretudo quando houver variáveis que não sejam integralmente controláveis. A impossibilidade de controle total pode decorrer do fato de se depender do atuar de outras pessoas ou instituições que podem ou não ter a mesma capacidade de trabalho ou de compreensão da importância da atividade. Pode, ainda, a dependência estar atrelada a alguma questão climática.

A verdade é que a existência de um plano e, mais do que isso, o fato de se ter realizado um planejamento, levará a pensar sobre as externalidades que podem ensejar alteração, bem como nas fragilidades ou carências envolvidas. Com isso, havendo o problema, aquele que planejou estará mais apto a encontrar, caso não a tenha programado, uma alternativa, no mínimo, satisfatória.

O plano, é bom que se diga, não é uma forma nova de atuação jurídica. Ela, de fato, envolve a utilização do repertório de atos de direito público e de direito privado recorríveis para o atingimento dos objetivos institucionais[7]. De bom alvitre mencionar que o planejamento envolverá também os conhecimentos não jurídicos que melhor dialogarem com o campo de atuação daquele que planeja ou com o teatro de operações onde haverá o desenvolvimento do plano.

No que pertine ao planejamento, mister referir que são insuficientes mudanças estruturais administrativas, sendo fundamental modificar a forma como atuam as organizações (processos) e como se relacionam entre si. Importante também, além de liderança agregadora, é a capacitação dos envolvidos para possam bem conduzir os processos estando ou não no centro do sistema de planejamento[8].

O fato é que somente com uma visão estrategica poder-se-á promover modificações e adaptações indispensáveis para dar concretude ao que nos comprometemos nas searas internacional e nacional. Nesse ponto, deita raiz a importância do planejamento.

O planejamento, em regra, está vinculado às políticas públicas. Dessarte, quanto mais eficiência houver no processo de concepção e no de implementação da política pública, menor será a possibilidade de o planejamento ser inexitoso.

Prudente, então, tratarmos nesse ponto sobre a formulação de uma política pública.

Política pública é a solução aduzida pela administração pública com o fito de resolver ou de minimizar problema concreto e socialmente relevante. Portanto, partindo-se dessa premissa, essa política deve ser o fruto dos melhores esforços estatais alinhados com contribuições e articulações do movimento social.

Não obstante, na fase de concepção da política, a preocupação com a qualidade dos processos decisórios levará à obtenção de informações sobre a situação a ser transformada, sobre as instituições e pessoas capazes de colaborar, sobre os conhecimentos necessários, sobre os interesses em jogo e sobre as experiências adotadas em casos idênticos no país ou em outros lugares, bem como sobre os resultados aferidos e sobre as formas de os avaliar.

Na fase da aplicação da política pública, definidos o público-alvo, os resultados pretendidos, os modos e os momentos de os atingir, os possíveis parceiros, os possíveis adversários e os espaços de negociação, devem ser arrolados os previsíveis entraves e as formas de os combater eficazmente.

Nesse quadro, sinteticamente, pode-se afirmar que, uma vez que a instituição decidir levar a cabo determinada política, deve se organizar para que ela chegue onde ela é indispensável.

Em decorrência disso, revela-se instrumento adequado a realização de audiência pública. Esse meio, perfectibilização da participação popular na administração pública, amplia o número de propostas sobre a temática em causa, pode permitir a produção de consensos necessários, bem como a diminuição de dissensos ou a constituição de estrategias de negociação que talvez fossem desconsideradas na formulação levada a cabo apenas por integrantes da administração pública ou por consultores contratados.

A qualidade dos processos decisórios e a qualidade da política pública que se quer implantar estão conectadas com a qualidade do plano que se quer por em execução.

Todavia, é bom que se diga que até as ideias ou propostas que não sejam técnica ou juridicamente relevantes necessitam de planejamento. Talvez, precisem mais ainda do planejamento do que aquelas. Ocorre que aqui o planejamento estaria mais focado nas estrategias de convencimento e de negociação.

Apresentadas essas ideias, passa-se ao exame do caso concreto.

Entende-se que há pontos essenciais para o enfrentamento do grande número de homicídios mais de uma vez mencionado.

Ao ver do signatário, o combate que se pretende travar não pode ser cogitado sem se também focar na efetivação de uma educação racialmente inclusiva, pois estar-se-á mirando pensando também nas gerações futuras e adotando-se meios que produzem resultados duradouros de médio e de longo prazos. Em síntese, predominará uma visão de nação e não apenas um meio desvinculado da sustentabilidade.

Nesse sentido, eleger-se-ia como fundamental que os planos de enfrentamento pretendidos perpassassem pelo cumprimento nas escolas privadas e públicas, de ensino fundamental e médio das disposições do artigo 26-A da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que dispõe sobre a obrigatoriedade de serem inseridos nos currículos escolares a história e cultura africana, afrobrasileira e indígena.

Parte-se do pressuposto de que aquele que tem uma educação inclusiva, ou seja, que assume os direitos humanos como valores por meio do qual passa a examinar os fatos da vida, não abordará mais ou com o emprego de violência os que forem não brancos.

Independentemente dessa visão de longo prazo, é inegável que é indispensável repensar os cursos de formação de policiais cujas cargas horárias para se abordar todos os temas de direitos humanos são extremamente pequenas. Ademais, como a socialização que se dá nessas atividades é interna, ou seja, como a apreensão de valores e de características institucionais se dá ao se desempenhar a atividade e não durante a formação inicial, é obrigatório pensar e prever uma formação continuada para policiais militares civis com ampla ênfase em direitos humanos. Essa é uma alternativa a ser considerada para diminuir a violência policial.

Existem disposições legais vinculadas à essa seara e existem estruturas administrativas constituídas e até solidificadas. Porém, o descumprimento da legislação supracitada é premiado com a impunidade. Isso porque, no Brasil, somente o Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul exerce o controle oficial junto aos Municípios, estando por inaugurar semelhante controle sobre o Estado.

Em se cuidando de desigualdade socioeconômica, indispensável que, com esteio em dados fidedignos do mercado de trabalho, principalmente no que diz com os níveis salariais e de empregabilidade, os planos de enfrentamento prevejam atuação estatal e privada, se possível, baseada na responsabilidade social corporativa. As conexões faltantes, que o plano poderia ensejar podem ser novas ou já existentes ou em elaboração.

Por oportuno, é de se sublinhar que há duas disposições do estatuto da igualdade racial que jamais foram cumpridas, mas que poderiam ser impactantes se melhor compreendidas pelo Poder Executivo federal.

Está-se a falar dos artigos 40 e 39, §3º do diploma já mencionado. O primeiro estabelece que o conselho deliberativo do fundo de amparo ao trabalhador (CODEFAT), que dispõe de bilhões de reais, deveria destinar recursos financeiros para receber programas, projetos e ações vinculadas à igualdade racial no mercado de trabalho. Todavia, tendo entrado em vigor no ano de 2.010, o instrumento e a disposição indicada não foram bastantes para que fosse destinado sequer um real para se ver cumprida a norma que se extrai do artigo já indicado. O segundo artigo, por seu turno, prevê que o poder público estimulará, por meio de incentivos, que as empresas tenham programas, projetos e ações voltadas à igualdade racial no mercado de trabalho. Transcorrido prazo mais do que razoável, não se promoveu a regulamentação do artigo sub oculis e, somente por meio dela, estarão definidos os reais benefícios fiscais e as obrigações que cumpridas os ensejarão.

Além de auxiliar na promoção desses dois artigos, o plano em liça poderia estimular a criação de grupos de trabalho regionais e nacionais aos quais competiria analisar o mercado de trabalho e propor mecanismos, instrumentos legais, articulações, cursos e eventos com o fim de alterar os dados que demonstram como o mercado de trabalho é sensível à raça e ao gênero das pessoas.

Tal proceder já foi adotado pelo Estado do Rio Grande do Sul.

Por intermédio do Decreto estadual número 53.505/2017, foi instituído grupo de trabalho que reúne entidades empresariais, secretarias estaduais, universidades, movimento social, Procuradoria-Geral do Estado e OAB/RS, visando a alterar positivamente o mercado de trabalho ao combater as influências negativas da raça e do gênero das pessoas.

Por fim, no que pertine à segurança pública, mister, como premissa, que seja examinada a legislação atinente aos crimes raciais. Isso porque à legislação atual tem conduzido a quase 70% de absolvição, desconsiderando-se a ocorrência de suspensão condicional do processo no caso de injúria racial e nos de crimes raciais cuja pena mínima seja de 1 ano.

Oportuno dizer que, sob o silêncio do movimento social, tramita o novo código penal. O respectivo anteprojeto é resultado do trabalho de um grupo de profissionais que parece ter desconsiderado a flagrante ineficácia dos textos das leis hoje em vigor, pois os reproduziu parcialmente.

CONCLUSÕES

A mortalidade de jovens negros e pobres, que atinge taxas altíssimas, está inserida em um quadro de racismo sistêmico. Por via de consequência, é inegável que o ataque deverá ser também sistêmico, ou seja, vinculado às possíveis soluções atinentes às desigualdades existentes na educação, no mercado de trabalho, na segurança, nos espaços de poder e outros espaços nos quais o racismo gere reflexo.

Assim sendo, o combate deverá ser abrangente para que surta efeito. Portanto, o plano de enfrentamento que se pretende ver previsto na Carta Magna deverá considerar os processos relativos à tomada de decisão, à constituição e à implantação de políticas públicas, as concepções de desenvolvimento, de eficiência e de eficácia, a importância da responsabilidade social corporativa e o conceito e a operatividade da stakeholder network value.

Em síntese, é insuficiente a constituição de soluções legislativas para problemas extremamente complexos, devendo se reforçar a indispensabilidade do planejamento para a satisfação de direitos fundamentais que cujas efetividade e  proteção são diuturnamente negadas para uma parcela significativa da população brasileira.

A PEC 129/2015 e o PL /2015 abrigam o mérito de reavivar questões socialmente relevantes, merecendo que a estrategia e a articulação sejam amplas a ponto de mobilizar um número expressivo de atores pertencentes ou não à comunidade negra. Impositivo, por conseguinte que a caminhada que se quer exitosa siga passos capazes de levar a resultados e impactos concretos positivos.

JORGE LUÍS TERRA DA SILVA

PROCURADOR DO ESTADO/RS

[1]WAISELFIESZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência contra os jovens do Brasil, Rio de Janeiro:  Garamond, 1.998.

[2]WAISELFIESZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2.016 – Homicídios por arma de fogo  no Brasil, Rio de Janeiro:  Garamond, 2.016

[3]WAISELFIESZ, Julio Jacobo. Mapa…

[4]. Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) https://www.unicef.org/publications/files/Violence_in_the_lives_of_children_and_adolescents.pdf, (acessado em 4/12/2017)

[5]KLIKSBERG, Bernardo. Repensando o Estado para o Desenvolvimento Social, superando dogmas e convencionalismos. Editora Cortez. 2ª Edição. São Paulo (Coleção Questões  da Nossa Época, v. 64).

[6]SIMON, Herbert Alexander. Rational Decision-Making in Business Organizations. Nobel Memorial Lecture, 8 December, 1978.

[7]COUTO E SILVA, Almiro. Problemas Jurídicos do Planejamento. Revista da PGE-RS, Cadernos de Direito Público em homenagem a Almiro do Couto e Silva, número 57, pags. 127-161. Dezembro de 2003.

[8]  REZENDE, Fernando, Planejamento no Brasil: auge, declínio e caminhos para a reconstrução/ Fernando Rezende. Brasília, DF: CEPAL. Escritório no Brasil/IPEA, 2010. (Texto para Discussão, 4).

*ESCRITO EM MARÇO DE 2019

5 de abril de 2022

Juventude, violência e segurança

Em 20 de maio de 2010, no Auditório da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a Rede Afro-gaúcha de Profissionais do Direito, coordenada por Jorge Terra, promoveu o encontro de vários segmentos com o fim de debater problema que ainda assola o Brasil e ainda não parece firme e adequadamente enfrentado: a relação entre juventude negra, violência e segurança pública.

Acesse o evento pelo link abaixo e construa a sua própria opinião !

LINK : https://www.youtube.com/watch?v=B5om1VSckkM

Jorge Terra

Rede Afro-gaúcha de Profissionais do Direito

13 de fevereiro de 2022

A serviço de quem nos quer mortos

   

A serviço de quem nos quer mortos

Tenho pautado meu comportamento pela busca de resultados concretos positivos. Por isso, não costumo me dedicar a falar sobre o que ou sobre quem desmerece minha atenção.

Todavia, essa minha visão caiu por terra ao saber das manifestações do Presidente da Fundação Palmares sobre a pessoa de Moise e sobre sua brutal morte.

Tudo, inclusive isso, tem limite.

Pode-se compreender que alguém integre um governo de extrema direita e que se filie ao seu ideário. Porém, ser cruel, mesmo que a pretexto de agradar chefia, eleitores e pessoas desalmadas, é inadmissível.

Chega!

Chegou a hora de olhos se abrirem e de, novamente, ser questionada judicialmente a atuação despida de valores humanitários de presidente que atenta contra as competências da instituição pública que preside.

Levantemo-nos e não permitamos que aqueles que traem o grupo que integram continuem a dizer e a fazer o que agrada aos que não veem as negras e os negros como pessoas e como cidadãs e cidadãos !!!!

Jorge Terra

Jorge Terra é Procurador do Estado do Rio Grande do Sul.

fonte: Afropress.com edição de 12 de fevereiro de 2022.

https://www.afropress.com/a-servico-de-quem-nos-quer-mortos/

17 de março de 2021

Conversaremos no dia 25 de março de 2021

Filed under: Uncategorized — jorgeterra @ 9:20
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Estava cortando a grama de minha casa no intervalo do almoço. O sol estava bem forte.

Passei a pensar como seria se estivesse na condição de escravo, ou seja, trabalhando para outra pessoa ganhar, sem intervalo, sem remuneração e sem esperança.

Sabe-se que foram milhões de vidas levadas inteiramente sob essa condição e o que resultou disso? Aquele que trabalhou sob o sol e sob a chuva foi rotulado como inapto para o trabalho assalariado sendo substituído por povos de outros lugares. E hoje ainda percebe os piores salários, não alcança postos de liderança e tenta provar que são falsas as crenças e os estereótipos de que é preguiçoso e pouco capaz.

Somente no mercado de trabalho, são perceptíveis o triste legado da escravidão e da forma da abolição da escravatura? Será?

Há consumidores que são perseguidos por seguranças desde que entram nas lojas? Há consumidores para os quais os vendedores alertam que os produtos podem ser adquiridos em até 6 parcelas ? Há consumidores que entram e saem das lojas sem ser atendidos? Essas situações seriam resquícios do comércio transatlântico de escravizados, da longa escravização e da inocorrência de um processo de justiça de transição?

No dia 25.3, às 18h, a Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra da OAB/RS, com as presenças do escritor Jeferson Tenório e do Professor José Rivair Macedo, quer virtualmente se encontrar contigo no evento que será alusivo ao dia em homenagem às vítimas do comércio transatlântico de escravizados e da escravidão e falar sobre suas recomendações para as instituições públicas e privadas em um esforço de mudança ainda pendente. É fundamental que pessoas antirracistas se engagem nesse processo obstinadamente.

VENHAM! Sem tua presença, nada será possível !

INSCRIÇÕES PELO SEGUINTE LINK:

https://www.sympla.com.br/homenagem-as-vitimas-do-comercio-transatlantico-de-escravizados-e-da-escravidao__1157809?fbclid=IwAR3bOPFLG3LA0Rqri5BYNUDZzrNwIQVYxLVk3NxEY4dY0JPlqOhycypXM_8

TRANSMISSÃO PELO CANAL DA OAB/RS NO YOUTUBE.

JORGE TERRA

PRESIDENTE DA COMISSÃO DA VERDADE SOBRE A ESCRAVIDÃO NEGRA DA OAB/RS

25 de abril de 2020

Evidências

Já é consenso que as políticas públicas devem ser concebidas e implementadas com base em evidências, ou seja, com base em dados decorrentes de observação ou de experimentação são identificados os grandes problemas e definidas as soluções.

Em razão disso, soou atécnica a discussão que se pretendeu estabelecer entre implementar ou não o distanciamento social no Brasil. Aliás, chegou-se ao ponto de se tornar antagônicas a preocupação com a preservação das vidas ante uma doença contagiosa e a preocupação com a manutenção de atividades econômicas. O fato é que há uma escala de valores e no topo dela está a vida, sendo que o direito à vida é plenamente exercido se há saúde e condições econômicas ao menos razoáveis.

A crise decorrente da pandemia de covid-19 permite numerosas abordagens e uma delas diz com a questão racial, pois se pode apontar para a evidenciada diferença da situação de brancos e de negros no Brasil e nos Estados Unidos, bem como para a insuficiência da cobertura jornalística concernente ao desenvolvimento da pandemia no continente africano.

Essa linha de pensamento pode ser adotada para se analisar as políticas públicas brasileiras de caráter universal com impacto na questão racial e as políticas públicas de caráter racial propriamente ditas. Se dados é que devem nortear as tomadas de decisão como pode o grande número de mortes de jovens por arma de fogo não ter enfrentamento efetivo? Se as pessoas negras, em especial as mulheres, recebem menos, têm piores condições de trabalho e maior desempregabilidade, como os governos estaduais e o federal nunca atuaram e não atuam no campo da iniciativa privada? Se há lei de cunho educacional que determina que sejam ensinadas as culturas negra e indígena nas escolas públicas e privadas e esses grupos raciais somados correspondente a maior parte da população, como Estados, Municípios e União descumprem a regra estabelecida.

A questão é que o racismo influencia a tomada de decisão e a ocupação dos espaços decisórios. Dessa feita, os problemas que interessam às comunidades negra e indígena, em uma cultura eurocêntrica, não são tidos como problemas nacionais e não ingressam na agenda nacional. Em outros termos, quando o problema diz respeito exclusiva ou principalmente a esses segmentos, não importa o que indicam as evidências.

Jorge Terra.

Presidente da Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra da OAB/RS.

20 de abril de 2020

Escola, hospital e supermercado

Na década de 1990, fui buscar minha esposa no trabalho. A instituição se situava quase ao centro da Vila Maria da Conceição.

Estacionei e meu concunhado desceu, pois iria buscar sua filha e chamar minha esposa.

Logo que ele desceu, alunos de minha esposa se aproximaram da janela do motorista e começamos a conversar. Quando percebi, três homens já tinham descido de um veículo sem identificação. Cercaram meu carro e queriam revistá-lo. Pedi que se identificassem. Identificados, revistaram e nada encontraram.

Enquanto faziam isso, dentro da instituição uma frase corria solta:

” – Estão prendendo o marido da Professora !”

Pessoas foram se aproximando e os policiais, já conhecidos da comunidade por extorquirem dinheiro de traficantes, assustaram-se e resolveram me conduzir ao Palácio da Polícia sob a acusação de desacato.

No trajeto, pensava que sofreria violência física. Mas não precisavam fazer isso se tinham a força da falsa imputação. Seguimos os quatro em silêncio.

Fiquei sentado por cerca de uma hora e uma servidora passava por mim e falava em voz alta:

“- Vai baixar o Presídio…!”

Veio conversar comigo um policial e fui ríspido ao perguntar se ele era o Delegado. Com toda calma, compreendendo meu estado de ânimo, nada disse e saiu. Depois, vim a saber que era o tio de outro concunhado que estava lá para me ajudar.

Passou mais um tempo e fui chamado pelo Delegado. Na sala, estávamos ele, eu, um dos policiais que me conduziram e um outro policial, amigo de minha esposa, que fora lá me ajudar. Quase no mesmo instante no qual entrei na sala, o Delegado recebeu uma ligação, em decorrência da atuação do tio de meu concunhado, e respondeu a quem lhe inquiria que estava junto no momento da ocorrência e que já a estava resolvendo. Colocando o telefone no gancho, o Delegado se dirigiu a mim. Disse que não haveria registro e que o caso estava encerrado, devendo ser esquecido pelas duas partes.

Mais adiante, soube que o motivo da abordagem inicial seria pelo fato de eu estar de carro no meio de uma vila. Note-se que meu carro tinha mais de cinco anos e que havia outros carros no local, possivelmente de outras Professoras.

E se eu tivesse sido preso? E se insatisfeitos com a falsa imputação, resolvessem incrementa-la com outras falsas imputações? Será que hoje eu seria um Advogado?

Em 2013, adolescentes negros atravessaram a rua onde ficava a escola na qual estudavam com o intuito de comprar biscoitos em um dos supermercados de uma grande rede gaúcha.

Quando já estavam por sair do caixa, foram abordados por seguranças do supermercado que os acusavam de furto e proferiam ofensas de cunho racial.

Revistadas as mochilas, nada foi encontrado. Em lugar de pedir desculpas, os seguranças expulsaram os três consumidores do supermercado. Ao pai de um deles, que dirigiu-se ao estabelecimento comercial, não quis a gerência prestar nenhuma informação.

Ajuizada a ação de natureza cível, o supermercado alegou que o fato não havia ocorrido e que essa configurava tentativa de se obter dinheiro. Mais adiante, transcorrido prazo superior a um ano desde o ajuizamento da demanda, diante do fato de que havia testemunhas dispostas a depor, o supermercado apresentou um dvd com imagens do ocorrido. Por ter dito que o fato inocorrera quando tinha cenas gravadas em seu próprio sistema, a empresa foi condenada às penas correspondentes à litigância de má-fé. Em decorrência das provas levadas aos autos, os adolescentes obtiveram a condenação da empresa na ação indenizatória.

Procurado por mim para que fossem realizadas atividades com fim reparatório para a comunidade negra, o supermercado, que já esteve envolto em outros casos de racismo, negou-se a conversar sobre o tema.

Agora, em 2020, uma senhora negra foi internada em um hospital já que havia sofrido uma parada cardíaca. O seu marido, também negro, que era seu acompanhante, foi falsamente acusado de ter furtado o telefone celular de uma enfermeira ou técnica de enfermagem desse hospital.

Ele estava sentado ao lado da cama de sua esposa quando foi abordado pelo chefe da segurança, pela profissional referida acima e por outros colegas dessa última. Ao mesmo passo que acusavam o mencionado senhor, o grupo proferia ofensas raciais sem se intimidar com a presença de outras pessoas.

Não satisfeito, o grupo mencionado levantou o senhor da cadeira e o levou para outro local. O chefe da segurança, aproveitando-se do momento, desferiu-lhe socos nas costas e conduziu a revista na bolsa e no corpo do senhor que, inclusive, foi despido. Nada sendo encontrado, a dona do celular revistou a cama e as fraldas da enferma sem nada encontrar.

Em lugar de apresentar pedido de desculpas, o grupo supradito expulsou o acompanhante das dependências do hospital. Depois de algum tempo, a dona do aparelho celular o encontrou na sala na qual ele havia sido esquecido. Tentaram então os funcionários do hospital, dizendo que fora um mero equívoco, silenciar a vítima oferecendo-lhe um modesto lanche. Tendo visto o que ocorrera com o esposo e também sido revistada, a paciente teve novo ataque cardíaco e veio a falecer.

A direção do hospital, por seu turno, disse que instalaria sindicância, mas que já tinha informação suficiente para consignar que não houve violência, ofensas raciais e relação entre a morte e o agir dos seus funcionários.

O posicionamento do hospital não surpreende, tampouco dignifica um estabelecimento voltado ao salvamento de vidas. Sem considerar que há testemunhas e exame de corpo de delito, nega que houve tortura nos termos da lei 9455/97, crime de racismo, crime de injúria racial e lesões corporais leves. Além disso, o estabelecimento não ofereceu atendimento psicológico aos familiares obviamente abalados com os fatos e com o falecimento.

Em comum, essas três histórias apresentam o fato de que pessoas negras que estavam a procurar locais de livre acesso acabaram sofrendo violência física ou moral. Em outros termos, procurados um estabelecimento de ensino, um supermercado e um hospital, acabaram ocorrendo abusos, discriminações, humilhações e morte.

Note-se que nem o transcurso dos anos entre os fatos (dos anos 90 a 2020), o que poderia ensejar um estágio civilizatório diferenciado, afastou a ideia de que o racismo permanece forte em nossa sociedade.

Mas o que fazer além de lamentar e de externar a insatisfação nas redes sociais ou nos meios de comunicação?

Há medidas de curto, de médio e de longo prazos.

Em primeiro lugar, é indispensável ter preocupação com a segurança pessoal, ou seja, dependendo de quem for o violador, poderá a violação de direitos tornar a acontecer como forma de amedrontar a vítima. Em segundo lugar, há de se procurar autoridades policiais com o fim de se registrar as ocorrências sempre dispondo de provas ou de formas de como as obter. Em terceiro lugar, há de se promover meios no sentido de que haja ações criminais e cíveis correspondentes. Em quarto lugar, se possível com o auxílio de profissionais, deve ser recomposta a autoestima da vítima.

Medidas de médio prazo concretizáveis seriam as realizações de formações iniciais e continuadas pertinentes aos direitos humanos e à igualdade racial no seio das instituições e as constituições de grupos interinstitucionais capazes de levar às instituições a se repensar e a alterar procedimentos. Já as de longo prazo seriam às direcionadas à educação em direitos humanos, em especial, às focadas na infância e na juventude como as implementações da educação para as relações etnicorraciais e das mudanças na documentação escolar consoante o artigo 26-A da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN).

Jorge Terra

Coordenador da Comissão de Direitos Humanos da Procuradoria-Geral do Estado/RS

Presidente da Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra da OAB/RS

Membro do Grupo Interinstitucional GT26-A

26 de agosto de 2018

Atenção com o futuro sem esquecer do passado.

Assim estava disposto na Constituição Brasileira de 1.967:

Art 150 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pais a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

§ 14 – Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral do detento e do presidiário.

Essa Constituição foi imposta ao Congresso pelo Poder Executivo, que já estava sob a égide de atos institucionais restritivos e desfalcado de suas principais lideranças oposicionistas. Bom lembrar que a Chefia do Executivo era exercida por militares, pois esse segmento, associado a grupos civis e, sabidamente, com a apoio dos Estados Unidos, depusera, em 1964, o então Presidente da República.

Sabe-se hoje que sob a vigência dessa Constituição, numerosas pessoas foram torturadas física e psicologicamente e que houve mortes em celas, em veículos, em salas de tortura e em outros locais.

Que  esse triste momento de nossa história não seja jamais esquecido. Que não nos iludamos com aqueles que, louvando aquele período, dizem que respeitarão a Constituição.

Tenhamos bem presente que um texto constitucional, um contrato ou qualquer outro acordo ou plano  são promessas que podem ou não transformarem-se em verdades. Então, sejamos vigilantes e precavidos.

 

Jorge Terra.

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