Jorge Terra

27 de julho de 2023

Dois meninos e dois lápis de cor

Em 2.010, um menino de pele branca e de cabelos castanhos desentendeu-se com sua professora em uma cidade alemã. O menino alemão, filho de um homem branco nascido na Argentina e de uma mulher negra nascida no Brasil, tendo uma irmã unilateral negra e brasileira, queria desenhar e pintar sua família com lápis marrom. A sua professora, contudo, de forma irredutível, impunha que ele utilizasse o lápis de cor amarela.

Não tendo como persuadir a professora, o menino adota uma postura radical: decide que não pintará o desenho em sala de aula, colocando-o em sua mochila e o levando para casa com o fito de, no dia seguinte, apresentá-lo da forma que ele pretendia originariamente.

Essa ocorrência talvez não tivesse maior significado se esse garoto de cinco anos não fosse oriundo de uma família cujo destino fora alterado pela intolerância.

A história começa onde hoje é a cidade sérvia chamada Kniçanin, que, na época, já que as pessoas que iam para lá eram alemãs, era considerada um povoado alemão, denominado de Rudolfsgnag. Na verdade, o Imperador, que residia na Austria, tinha autoridade sobre a localidade.

Em 1944, durante a Segunda Guerra Mundial, quando o exército russo se deslocava para a Alemanha, a maioria das famílias alemãs abandonou o povoado, dirigindo-se à Austria ou à Alemanha. A família de nosso querido desenhista permaneceu, sendo alvo da perseguição instaurada pela Iugoslávia, que criara quatro ou cinco campos de prisioneiros na região.  Um deles era o campo de Rudolfsnag.

No campo supracitado, morreram muitas crianças e idosos. Encarceirados, entre tantos alemães, havia um menino, sua tia e os filhos dela. A mãe do menino fora encaminhada para a Rússia, onde ficou presa por quatro ou cinco anos, e seu pai, que era soldado, fora preso pelos britânicos.

Sabemos que a Segunda Grande Guerra teve motivações econômicas, históricas e políticas, mas, na sua raiz, estava a intolerância, tanto a que levou à consolidação de regimes calcados no militarismo e no racismo, quanto a que impediu os povos de evitar o confronto armado. Nesse cenário, as vidas restaram despedaçadas.

Em 1.949, a Cruz Vermelha conseguiu reunir a família mencionada acima: o menino, agora com seis anos, seus pais, sua tia com seus dois filhos e seu marido, que também estava preso. A tia do menino, seus filhos e o seu marido foram para Stuttgart; o menino e seus pais para Viena e depois para a Argentina. Aliás, entre 5 a 10 famílias de Rudolfsnag foram para a Argentina. Outras tiveram como destino o Brasil, mas a maioria delas foi para Viena e para a região da Floresta Negra na Alemanha.

Chegando à Argentina, apesar de frequentar o clube alemão, o menino aprendeu a amar a terra, seus costumes e o River Plate. Em Buenos Aires, casou e teve filhos. Um de seus filhos, visitando o Brasil a trabalho, em Porto Alegre, conheceu uma mulher brasileira e passou a também amar sua filha com a intensidade de um pai. Os três, então, rumaram para Buenos Aires, mas a crise econômica os fez partir para a Alemanha, onde a família passou a ter quatro pessoas com o nascimento de nosso pintor.

Os dois meninos, que na verdade são avô e neto,  mostram-nos como a intolerância, sobretudo, quando atinge a política, a educação e as relações familiares, é capaz de nos afastar da felicidade. Mostram-nos, também, que ela pode ser suplantada ou, ao menos, minimizada com a determinação, com a capacidade de superação e com o amor. Sim, o amor. As duras lições aprendidas pelo avô, viram-se solidificadas em seu filho, capaz de amar e de se fazer amar por pessoas de raça e de vivências diferentes, chegando ao neto que, em tenra idade, soube se posicionar diante da intolerância.

Jorge Terra

  • ESCRITO EM 2010.

7 de maio de 2021

O hino ou o cântico

Um hino e um cântico dizem muito sobre quem os entoa, bem como sobre o que se pensa sobre outros grupos.

Quando de tudo que há para gritar em um estádio de futebol, elege-se a intolerância, evidencia-se que ela é fundante para aquele grupo, podendo ser um dos motivos de estarem constituídos como grupo. O teor do que é dito aponta quem é indesejado naquele ambiente, quem é tido como inferior ou com menos direitos na visão do grupo.

Não há adolescente que não saiba que homossexuais, que mulheres e que negros são discriminados em numerosos espaços. Não há adolescente que se surpreenda com o resultado de pesquisas relativas ao mercado de trabalho ou à segurança. Também não há políticos ou gestores privados ou públicos que desconheçam essa realidade.

A questão é o nível de compromisso com a mudança diante de um quadro de sofrimento e de injustiça.

Não há como impor ou estimular o amor. Todavia, há como impor e estimular o comportamento respeitoso e justo.

Nos campos de futebol, desconhecidos se abraçam e até choram juntos diante de um gol ou de um ato de superação individual ou coletiva. Mesmo abertos a nobres sentimentos e à momentânea fraternidade, são capazes de, a plenos pulmões, ofender racialmente ou por conta de orientação sexual ou, ainda. por questão de gênero.

A linguagem é importante e não basta se esconder na armadura de dizer não ser homofóbico, misógino ou racista. É indispensável ser antidiscriminatório.

A apatia e a indiferença são parceiras do cometimento de danos e ferrenhas inimigas das mudanças comportamentais.

O hino riograndense ofende parte da população gaúcha e sabes disso. Talvez não saibas que o hino francês, ao falar em derrame de sangue impuro, ofende parte de sua população, que entende esse trecho como alusivo à sangrenta guerra contra a Argélia. Se és brasileiro, pouco podes fazer quanto a isso.

Mas se és brasileiro e especialmente gaúcho, não te preocupa saber que há quem não goste do hino que todos nós gaúchos aprendemos, quando pequenos, em casa, nas escolas e nos estádios? Mesmo que consideres uma demasia ou que tenham te dito que a parte na qual se faz referência a “escravo” tem relação com a Grécia e que restou de uma alteração ocorrida em 1966, vendo que há quem se ofenda, não cogitas alguma mudança?

Em verdade, como símbolo de um Estado, importa o que ele transmite e o que ele é capaz de gerar nas pessoas.

Mas um hino serve para unir pessoas? Serve para enaltecer fatos históricos? Serve para lembrar dos erros do passado e da necessidade de acertarmos as contas?

Como dito, um hino diz muito sobre quem o entoa. Se, sabendo que causas dor a alguém, mas essa te é indiferente, tens muito a pensar sobre afeto, sobre coesão social e sobre nação.

Como dito, a apatia é inimiga da mudança comportamental e amiga da violação de direitos. Quem sabe participas de um movimento para que seja promovido um concurso no qual sejam apreciadas sugestões de alterações da letra sem prejuízos melódicos? Quem sabe demonstra aos gestores estaduais da cultura e do governo a tua intenção de que o hino de teu Estado seja realmente de todas as pessoas que aqui nasceram ou vivem?

Isso sim seria uma bela façanha para ser contada e cantada ao longo de muito tempo!

*escrito em 9 de agosto de 2019.

Jorge Terra

Presidente da Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra da OAB/RS.

15 de dezembro de 2018

Frente contra o ódio e a intolerância (por Aline Kerber)

Frente contra o ódio e a intolerância (por Aline Kerber)

Movimento Mães e Pais pela Democracia nasceu da união de um grupo de famílias do Colégio Marista Rosário, de Porto Alegre. (Divulgação)

Aline Kerber (*)

Na qualidade de porta-voz do movimento Mães e Pais pela Democracia, gostaria de destacar a importância da recente criação do Fórum de Combate à Intolerância e ao Discurso de Ódio promovido pelo Ministro Público Federal em Porto Alegre para a segurança dos direitos humanos de todas e todos nós, sobretudo neste momento histórico em que se questionam os valores mais básicos da na nossa já combalida democracia.

Agradecemos desde já o convite para nossa participação e registramos que somos guiados pelas mesmas premissas que orientam este Fórum, ou seja, a garantia, o respeito e a promoção da integralidade dos direitos humanos, o que pressupõe o firme enfrentamento a todas as formas de violências e desigualdades, como o racismo, o sexismo, a misoginia, a xenofobia, a LGBTfobia, entre outras atentatórias à liberdade de ser e estar no mundo!

O movimento Mães e Pais pela Democracia nasceu da união de famílias do Colégio Marista Rosário de Porto Alegre, preocupadas com o quadro de grande acirramento e conflitualidade social que se seguiu ao processo eleitoral, na esteira de iniciativas como o “Escola sem Partido”, que nada mais é que o aproveitamento político-partidário de determinados segmentos sociais contra a livre manifestação do pensamento e da opinião de jovens estudantes nessa e em tantas outras escolas, públicas ou privadas, do Estado e do país.

Não podemos aceitar que as diferenças que constituem nossa humanidade, que fundam a convivência com a alteridade e a vida em coletividade sejam ameaçadas pela intolerância e pelo discurso de ódio. A escola é o lócus por excelência da democracia, da valorização das diversidades, do congraçamento entre os saberes técnicos e as demandas sociais, do encontro da história com o novo, a inovação, do fortalecimento dos espaços de socialização e sociabilidade.

Por isso, desde o início deste movimento, temos nos preocupado em construir parcerias, estabelecer pontes e buscar convergências em prol das verdadeiras prioridades da educação no país: a diminuição dos déficit’s de ensino-aprendizagem e a superação de um ambiente hostil e violento ao ensino, hoje marcado pela interdição da palavra, do diálogo e do reconhecimento do outro na igualdade da sua diversidade que nos torna humanos!

Celebrar os nossos professores e professoras, as escolas que não abdicam da sua missão de educar sempre e às famílias pelo amor que compartilham com os seus e com os nossos são alguns dos objetivos do coletivo Mães e Pais pela Democracia.

Contem conosco nesta luta que está apenas começando!

(*) Integrante do movimento Mães e Pais pela Democracia

fonte: SUL21

8 de junho de 2018

PGE DEMONSTRA A CONSTITUCIONALIDADE DO CONSELHO DO POVO DE TERREIRO DE RIO GRANDE

 

 

 

 

08-06 PGE NOTICIAS 2018ff

6 de novembro de 2017

PGE-RS e TV Pampa lançam campanha contra o preconceito

A PGE-RS e a TV Pampa deram início, na semana passada, à campanha “Não Cale, Compartilhe”, com o objetivo de combater o preconceito em suas variadas formas, como em relação à raça, à deficiência, ao gênero, ao sobrepeso e à população LGBT. Foram produzidos seis pequenos vídeos, com depoimentos de pessoas que sofreram algum tipo de discriminação, relatando como isso prejudicou suas vidas e como foi a superação. A ação, resultado de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre a PGE e a emissora, é veiculada na televisão, nos programas Pampa Debates e Atualidades Pampa, e nas redes sociais.

As primeiras veiculações foram em 23 e 24 de outubro, com a vivência de Adriana Souza sobre preconceito em relação à população LGBT. O Coordenador Adjunto da Comissão de Direitos Humanos da PGE (CDH), Procurador do Estado Jorge Luis Terra da Silva, explica que os temas e o formato foram escolhidos em conjunto pela PGE-RS e pela TV Pampa. São vídeos curtos, em que a pessoa, de costas e no escuro, relata o que passou. Ao final, iluminada e encarando a câmera, convida o espectador a também compartilhar as histórias vivenciadas. “A ideia é que a pessoa revele, divida, compartilhe. A campanha não visa a uma mera denúncia, mas a mostrar que é possível superar”, comenta Dr. Jorge.

Dos seis vídeos, dois são sobre a questão racial, que deu origem ao TAC. Dr. Jorge relatou sua experiência e já se considera atingido pela campanha. “Gravei um depoimento e não gostei do resultado. Outra pessoa gravou e me encorajei a falar. A dificuldade que tive é que estou preparado para falar sobre dados, números, mas, quando chega no momento de falar de si, é diferente. Até pelo exemplo dos outros, contei minha história”.

Dr. Jorge diz que a expectativa para a ação é a melhor possível. “Temos poucas emissoras com forte apelo local e a Pampa é uma delas. Tem apelo muito grande no Rio Grande do Sul e em Porto Alegre. É importante ocuparmos esse espaço para abordar um tema que aflige um número grande de pessoas que estão próximas de nós, sofrendo, e não percebemos. Ou percebemos, mas não conseguimos calçar seus sapatos”.

A Coordenadora do Centro de Conciliação e Mediação da PGE, Procuradora do Estado Elisa Berton Eidt, afirma que considerou a ideia da ação bastante pertinente, pois se utiliza do conhecimento técnico da emissora de TV para a elaboração de vídeos educativos, que, de forma clara, transmitem à população em geral a importância da adoção de conduta que respeite os direitos humanos, sem preconceito, sem agressão. “O retorno esperado é uma maior conscientização sobre as violações aos direitos humanos, que ocorrem diariamente e muitas vezes sequer há percepção da sua gravidade”, explica. “Por meio dessa iniciativa, a PGE visa à não repetição da conduta que ensejou a celebração do TAC, além de propiciar um maior alcance de campanha educativa em direitos humanos”.

Segundo Dr. Jorge, a relação com a emissora foi extremamente harmoniosa e colaborativa, sendo um momento de aprendizagem e de crescimento para todos. “Por esse motivo, acreditamos no êxito dessa primeira fase da campanha, que, mais adiante, abordará outros temas, como, por exemplo, a liberdade religiosa”, finaliza.

 

CRONOGRAMA

Vídeo 1 – 23 e 24 de outubro

Vídeo 2 – 30 e 31 de outubro

Vídeo 3 – 06 e 07 de novembro

Vídeo 4 – 13 e 14 de novembro

Vídeo 5 – 20 e 21 de novembro

Vídeo 6 – 27 e 28 de novembro

COMUNICAÇÃO SOCIAL DA PGE/RS

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