Jorge Terra

17 de abril de 2024

Museu e Centro de Referência em Porto Alegre

O município de Porto Alegre tem lei que prevê um equipamento público denominado de Museu da História e da Cultura do Povo Negro. Embora seja lei do ano de 2010, o referido museu não existe.

Em se sabendo que o município, como outros tantos, não cumpre a obrigação de ensinar as histórias e as culturas africanas, afrobrasileiras e indígenas (artigo 26-A da LDBEN), não gera surpresa a inexistência referida.

O que há de surpreendente é a edição de lei, do ano de 2020, que altera o nome do inexistente museu, acrescentando o nome do vereador que havia proposto a sua criação. Entende-se que a maior homenagem ao proponente seria dar concretude à lei anterior e não editar uma lei sem efeito prático.

Porto Alegre teve um espaço denominado de Centro de Referência do Negro Nilo Feijó. O prédio onde estava sediado esse centro está com sua estrutura comprometida conforme uma das secretarias municipais. Uma vez que não houve nenhum evento climático grave na região onde ele funcionava até o advento da pandemia de covid-19, é razoável presumir que o problema se deve à inocorrência das obrigatórias manutenções prediais.

O fato é que o chamado Centro de Referência do Negro Nilo Feijó era cedido informal e ocasionalmente para algumas entidades sociais e essas lá realizavam atividades culturais. Note-se que, apesar do nome, jamais foi um centro de referência. Centro dessa espécie precisa ter exposições permanentes e temporárias, acervo de peças e de obras, biblioteca, pequeno auditório, teatro, local para cursos, corpo técnico capaz de gerar uma cultura viva, de receber estudantes e pesquisadores, bem como de promover atividades, projetos e programas.

A realidade é que não há movimento por quem deveria tomar a frente na constituição do museu e do verdadeiro centro de referência. Seguramente, a razão não está na falta de prédios municipais ou de qualificados servidores públicos que possam levar adiante tais empreitadas. Faltam o reconhecimento da importância da cultura de parte da população, a percepção da injustiça das decisões tomadas até aqui e a compreensão de que a cultura tem forte vinculação com o desenvolvimento.

Os direitos fundamentais culturais das pessoas negras não são efetivados no município de Porto Alegre e não há perspectiva de que tal situação mude, apenas a esperança. Isso porque a população negra não tem conseguido incidir fortemente na agenda política cultural da capital do Estado.

A Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra da Ordem dos Advogados do Brasil, entendendo como de cunho reparatório as constituições dos dois espaços, fez e faz a sua parte. Por tal motivo, a Comissão insta o município para que cumpra seu papel com responsabilidade e com lisura, prestando informações fidedignas e, mais do que tudo, constituindo espaços que respeitem os direitos da população negra de Porto Alegre. Além disso, a Comissão conclama os conselhos de direitos locais, os órgãos de fiscalização e a sociedade para que procurem fazer tudo o que considerem possível por conta de que a cultura é um caminho de efetiva mudança.

Jorge Terra

Presidente da Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra da OAB/RS

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